sábado, 1 de dezembro de 2012

A rodada surreal: quando o Olímpico recebeu três jogos na mesma tarde

Que nos perdoe André Breton, mas a manifestação mais contundente para definir o surrealismo, movimento artístico por ele liderado nos anos 1920, iria ocorrer décadas depois, longe de Paris e de seus charmosos boulevares. Tudo aconteceu na bem brasileira Porto Alegre, numa tórrida tarde de domingo, um 11 de dezembro de 1994. Quando o Olímpico recebeu três partidas numa mesma tarde.




Todos esses jogos eram oficiais e válidos pelo Gauchão daquele ano. A obra surrealista, no caso, foi escrita pelos dirigentes da Federação Gaúcha de Futebol, que criaram um Estadual de pontos corridos, conhecido até hoje como o "Gauchão Interminável". Começou em 5 de março e teve o seu fim em 17 de dezembro, com 23 clubes duelando em turno e returno. A ideia da federação era diminuir os representantes na primeira divisão - nada menos que nove equipes seriam rebaixadas. O que se viu, no entanto, foi uma competição com baixa média de público, e uma das páginas mais curiosas da história do Olímpico, estádio que se despede neste domingo para dar lugar à Arena.



Mas por que o Grêmio, sem chances de título (o campeão seria o Inter), precisou atuar três vezes num mesmo dia? Foi uma forma de "zerar" os jogos no Gauchão, já que o time de Luiz Felipe Scolari vivia uma verdadeira maratona de competições: Copa do Brasil, Brasileiro, Supercopa e Conmebol, passando fácil das impensáveis 95 partidas na temporada.



Para aguentar os 270 minutos, em partidas às 14h, 16h e 18h, Felipão (que ficou à beira do gramado apenas no confronto final, colocando Zeca Rodrigues nos anteriores) concentrou 42 jogadores e lançou a campo 34 deles. Segundo o jornal Zero Hora da segunda-feira posterior, o vaivem de atletas confundiu até o sempre atilado roupeiro Hélio.



- O pior é que estes três jogos juntos não valem um - resmungara o funcionário.



A torcida tinha a mesma impressão. Tanto que protagonizou um dos menores públicos da história do Olímpico. E havia até promoção de ingressos: cadeiras e social a R$ 3. Estudante pagava R$ 1,50. No total, 758 almas sentaram no duro concreto do estádio, sendo apenas 247 pagantes. A renda, portanto, seria irrisória: R$ 690.


Desde 19 de setembro, data da inauguração do Olímpico, até dezembro, na abertura da Arena, o GLOBOESPORTE.COM traz matérias especiais sobre a memória da atual casa tricolorPara aguentar os 270 minutos, em partidas às 14h, 16h e 18h, Felipão (que ficou à beira do gramado apenas no confronto final, colocando Zeca Rodrigues nos anteriores) concentrou 42 jogadores e lançou a campo 34 deles. Segundo o jornal Zero Hora da segunda-feira posterior, o vaivem de atletas confundiu até o sempre atilado roupeiro Hélio.




- O pior é que estes três jogos juntos não valem um - resmungara o funcionário.



A torcida tinha a mesma impressão. Tanto que protagonizou um dos menores públicos da história do Olímpico. E havia até promoção de ingressos: cadeiras e social a R$ 3. Estudante pagava R$ 1,50. No total, 758 almas sentaram no duro concreto do estádio, sendo apenas 247 pagantes. A renda, portanto, seria irrisória: R$ 690.



Adversário Horário Uniforme Time

Aimoré

(0 a 0) 14h Celeste Murilo; Cristian, Luciano, Éder e Júlio César; Puma, Alexandre e André Muller; Tefo (Juliano), Escurinho e Rodrigo Gasolina. Técnico: Zeca Rodrigues

Santa Cruz

(4 a 3) 16h Tricolor Danrlei; Ayupe, Scheidt, Agnaldo Liz, Arílson; Pingo, Jamir, Jé (Émerson) e Carlos Miguel; Fabinho e Jacques (Ciro). Técnico: Zeca Rodrigues

Brasil-Pel

(1 a 0) 18h Branco Aílton Cruz; Jairo Santos, César, Cristiano e Duda; André Vieira, Wallace e Émerson (Jacques); Carlinhos, Ciro (Juliano) e Cristiano Júnior. Técnico: Felipão

Vitórias, calor de 48ºC e picolé nas sociais



Em campo, o aproveitamento do Grêmio foi bom. Um empate, duas vitórias. A primeira partida, às 14h, sob um sol que parecia não ter fim, com sensação térmica de 48ºC, foi diante do Aimoré. Juniores e juvenis completavam a equipe, vestida de azul celeste. Destaque para Murilo, que seria por muitos anos reservas de Danrlei. Com suas mãos, evitou a derrota dos mandantes ao agarrar um pênalti, aos 34 minutos do segundo tempo.



Antes, porém, um fato "inédito", segundo Zero Hora. Hoje é comum, mas, na época, soava raro um árbitro interromper a partida para hidratação dos atletas. A decisão de Willy Tissot arrancou aplausos dos torcedores, compadecidos com o forte calor a assolar os jogadores. E ficou nisso: 0 a 0.



Para poucos

Público pagante: 247 pessoasPúblico total: 758 pessoasRenda: R$ 690A primeira vitória da insólita tarde viria no jogo das 16h. Mas não sem mais doses de sofrimento. Mesmo com sete titulares, só conseguiu vencer o Santa Cruz aos 47 minutos do segundo tempo, marcado pelo atacante Fabinho. O zagueiro Agnaldo Liz antes havia desperdiçado um pênalti para o Grêmio.



A maratona chegava ao fim com o confronto das 18h, diante do Brasil, de Pelotas. Minutos de correria para Emerson. O então jovem meia havia entrado no segundo tempo diante do Santa Cruz e precisou ser rápido no vestiário para trocar o uniforme tricolor pelo branco. Seria titular no jogo final.



- Lembro que as palestras de pré-jogo foram muito rápidas. O clima também era de descontração, era fim de ano e pouco valiam as partidas - recorda Emerson, que ganharia o mundo, atuando em clubes como Real Madrid, Milan e Bayer Leverkusen até voltar ao Olímpico hoje, como auxiliar técnico de Vanderlei Luxemburgo. - Aquela tarde foi uma experiência única.


Já o derradeiro rival, o Xavante, chegou ao Olímpico às 15h e deparou com os vestiários todos ocupados. O jeito foi levar a delegação para a providencial sombra do setor das sociais. O tempo livre foi recheado com uma rodada de picolés, pagos pelo técnico Ernesto Guedes. Em campo, sem picolé e com o calor um pouco menos impiedoso, novo sucesso azul, 1 a 0, aos 22 minutos do segundo tempo, gol de cabeça de Jaques. O atacante, junto com Emerson e Ciro, foi o único a atuar em duas das três partidas.




- Foi no improviso... Antes, a gente dava risada, brincava que conseguiria jogar as três partidas. Mas não foi fácil - conta Jaques, hoje gerente de futebol do Cerâmica, clube deGravataí. - Três jogos no mesmo estádio, da mesma equipe, do mesmo campeonato... Pelo que eu acompanho, não conheço nenhum caso no futebol mundial.



Na época em que vitória valia dois pontos, que o Plano Real começava a dura empreitada de remediar a economia nacional e que Felipão ainda era apenas um gaúcho de bigode e pouco conhecido pelo centro do país, o Grêmio, enfim, conseguiu completar 270 minutos em campo numa mesma tarde. Curiosidade com cara de façanha. Mais uma história que o Olímpico levará consigo no seu não menos surreal momento de dar adeus.





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