sábado, 1 de fevereiro de 2014

"Tenho em mãos uma equipe em condições de enfrentar qualquer uma de igual para igual", diz Enderson Moreira Em entrevista a Zero Hora, técnico fala sobre os planos para o Grêmio de 2014

"Tenho em mãos uma equipe em condições de enfrentar qualquer uma de igual para igual", diz Enderson Moreira Lauro Alves/Agencia RBS
Enderson Moreira diz ter "obsessão por vitórias" Foto: Lauro Alves / Agencia RBS
Luís Henrique Benfica
Enderson Moreira, 42 anos, se diz um observador, "que espera para chegar no ambiente e não gosta tanto de chamar a atenção". Nada estranho para alguém que nasceu em São Paulo e com apenas 20 dias mudou-se com os pais para Belo Horizonte. Os mineiros, sabe-se, são discretos.
Há momentos, contudo, em que o técnico do Grêmio se transforma. É quando está á beira do gramado, comandando a equipe.  
— Sou muito emocional. As pessoas acham que sou tranquilo, mas, na beira do campo, sou uma energia muito forte — define-se.
Exigente, ele promete uma equipe competitiva, sem abdicar de um futebol de qualidade. Algo que tentava fazer no Venda Nova, clube amador de Belo Horizonte.
— Eu jogava de volante, mas com muitas qualidades. Sabia passar bem a bola (risos).Zero Hora — Você se considera preparado para a cobrança forte por títulos?
Enderson Moreira —
Difícil falar do que vamos enfrentar pela frente. Mas me preparei para isso. Nos clubes de Minas, também não se pode perder. Mas nunca vi rivalidade como a daqui, a forma como as pessoas são apaixonadas por seu clube. Em Belo Horizonte, os torcedores convivem muitíssimo bem, apesar das diferenças. Aqui, vejo coisas que não imaginava. No futebol brasileiro, a equipe tem que ganhar sempre. Nesses 15, 16 anos de treinador, me preparei também para os momentos de turbulência, que fazem parte do nosso crescimento.
ZH — O Grêmio de Enderson será um time diferente daquele visto pelo torcedor no ano passado?
Enderson —
Acredito que sim. Cada treinador tem uma concepção de jogo. Não dá para ser a mesma coisa que Renato (Portaluppi) e Vanderlei (Luxemburgo) foram. Alguma característica diferente a gente vai agregar. Nossa ideia é ter uma equipe competitiva, que possa marcar bem sem a bola e jogar quando tiver a posse. Muitas vezes iremos jogar bem e perder, muitas vezes iremos jogar mal e ganhar. Tenho em mãos uma equipe qualificada, com jogadores de altíssimo nível, em condições de enfrentar de igual para igual qualquer equipe do Brasil ou da América do Sul, em qualquer estádio e em qualquer competição.
ZH — A amostragem ainda é pequena, mas o torcedor gostou do desempenho contra o Aimoré. Você acha que o Grêmio está preparado para enfrentar as equipes mais fortes na Libertadores?
Enderson —
Viemos de uma equipe pronta. Não a pegamos do zero. Não estou pegando uma equipe sem treinamento, ela já tem a bagagem do Vanderlei e do Renato. Agora, estou colocando alguns outros quesitos que, para minha ideia de jogo, são importantes. Mas ainda vamos passar por muitas dificuldades. Temos que ver como vai ser a resposta quando sair atrás do placar, ou vir de uma derrota e ter de reagir já no próximo jogo. Na primeira partida, a equipe deu demonstração de jogo equilibrado, usando bem os lados do campo, marcação forte, transição rápida, aspectos que acho muito interessantes na formatação.
ZH — A saída tumultuada do Inter o estimula mais a querer vencer no Grêmio ou aquilo já ficou no passado (em 2011, Enderson foi demitido do Inter B pelo diretor Roberto Siegmann)?
Enderson —
Não houve tumulto, não houve nada de excepcional. Havia um profissional à frente de um projeto e um diretor que achou que era o momento de interromper. Vi isso como uma coisa mais natural. Na verdade, contribuiu para que eu pudesse acelerar o meu processo de amadurecimento e virar treinador de equipe profissional. Foi um empurrão. Eu poderia ficar aqui acomodado na base mais dois, três anos. Aquilo fez com que eu entrasse mais rapidamente no mercado e dali para a frente minha carreira foi sempre evoluindo, eu pude conquistar mais espaços.
ZH — Seu estilo é totalmente diferente de Vanderlei Luxemburgo e Renato Portaluppi, que tinham o perfil do boleiro. Como você se posiciona perante os jogadores?
Enderson —
É difícil fazer qualquer tipo de comparação. Minha conduta é de proximidade com os jogadores, com uma certa distância. Eu tenho bom contato com eles, conversamos, mas mantemos a distância necessária para que eles saibam realmente identificar que eu valorizo o trabalho, que estou muito atento a questões profissionais, que exijo o máximo para que ele possam render o máximo possível.
ZH — Que marca você pretende deixar no Grêmio?
Enderson —
A marca de uma equipe bem organizada, que entre em campo sabendo o que tem de fazer, que tenha, alegria de jogar uns com os outros. Que possamos demonstrar isso ao torcedor, uma equipe que está fazendo de tudo para merecer a vitória, sempre se dedicando.
ZH — E que, de preferência, erga um troféu ...
Enderson —
Eu acho que a gente só sobrevive no mercado se conquistar. Não há outra saída. Não há alternativa B, C ou D. Só há uma, que são as conquistas. Espero que haja taça. Senão, provavelmente não estarei aqui no próximo ano para poder conversar com vocês novamente (risos)
ZH — Cite um modelo de treinador.
Enderson —
Tenho imensa admiração pelo "seu" Ênio Andrade. Foi com quem eu mais me identifiquei na vida, mesmo não o conhecendo. Eu via coisas muito inteligentes da parte dele. Depois, confirmei isso com Luís Fernando (Luís Fernando Rosa Flores, um de seus auxiliares, que foi jogador de Ênio Andrade). Ele falava que era um treinador muito tático, que enxergava bem, fazia mudanças durante o jogo. "Seu" Ênio sempre conquistou títulos maravilhosos, às vezes com equipes mais limitadas, que conseguia fazer jogar em alto nível. Meu objetivo é ser um treinador que também possa enxergar por onde os jogadores devam caminhar.
ZH — Algum outro nome?
Enderson —
Tenho uma admiração enorme pelo Felipão. Acho um treinador de altíssimo nível. Às vezes, falam que ele é só motivador, que tem o vestiário sob controle. Mas ele é muito tático, nos surpreende constante com algumas questões. E, às vezes, não valorizam esse lado.
ZH — Você procura deixar bem claro que não quer deixar passa a ideia de ser um teórico do futebol, embora seja respeitado por seu conhecimento tático ...
Enderson —
Eu não teria problema nenhum em passar essa imagem, por ser formado em Educação Física. Mas ela não condiz muito com o meu dia a dia. Por essência, por ter jogado, sei muito o que é um vestiário, as ambições de um jogador. Sempre tento pegar a teoria e transformá-la em uma maneira bem prática e objetiva de trabalhar. Trabalhei muitos anos com a base, sei o que buscam e têm como objetivo. Então, não tenho essa coisa de querer ensinar futebol para ninguém.
ZH — Porque os treinadores brasileiros não se dão bem na Europa?
Enderson —
A língua é um aspecto limitador. São poucos técnicos que conseguem dominar fluentemente o idioma. Não dá para chegar na Espanha falando portunhol. Isso traz um preconceito. O argentino e o chileno não tem essa dificuldade. Às vezes, o treinador brasileiro quer chegar em determinados locais e colocar sua cultura, sua forma de ver futebol. Acho que tem de ser o contrário, tem que saber onde está pisando, quais são os costumes. São alguns cuidados a que o treinador tem que estar sempre atento.
ZH — Técnico tem que ser amigo de jogador ou conquistá-lo por seu conhecimento tático?
Enderson —
Este é o principal objetivo de um treinador, não é? A gente até pode ter com um atleta como amigo, agora ou futuramente. E eu tenho vários exemplos disso. Mas os jogadores não têm a obrigação de gostar do Enderson para que tenhamos uma boa relação profissional. É muito importante que a gente conquiste o respeito desses atletas. Não é o fato de gostar, de ser parceiro, de ser amigo, de estar no dia a dia, mas ter parceria no sentido de ter respeito, cumplicidade em cima de buscar vitórias e conquistar. É isso que eu busco com eles.
ZH — Jogador brasileiro gostar de treinar parte tática? O que se diz é que o jogador brasileiro só gosta de jogar ...
Enderson —
Eu acho que, nos últimos anos, o futebol brasileiro tem desenvolvido jogadores com muito mais interesse por isso. Antigamente os jogadores só se preocupavam em jogar. Hoje, são muito mais inteligentes em questões táticas e técnicas, são muito mais abertos. Nos meus treinos, faço atividades táticas e técnicas que possam ser motivantes. Hoje, nosso jogador está muito mais tático, entende muito mais as variáveis. Mas, no aspecto técnico, temos que melhorar. Tem-se a ideia de que jogador brasileiro é muito técnico. Costumo falar que é muito habilidoso. Na eficiência, por vezes, o europeu nos supera.
ZH — Você se considera um treinador obsessivo por conquistas?
Enderson —
Não faço projeções para daqui a três ou seis meses, mas para o próximo jogo. Eu tenho um lado muito competitivo, quero ganhar sempre. Quero que a gente possa merecer a vitória, essa é a cobrança que eu faço aos jogadores. Que o torcedor possa ver das arquibancadas e cadeiras um time que está merecendo ganhar. Porque, num jogo nem sempre o melhor vence. Mas temos que mostrar que merecíamos a vitória. Eu tenho obsessão por vitórias. É o que nos faz conquistar títulos.

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